Caminhar no Escuro…

Por Aurora

Quando eu era criança, morria de medo de ter que levantar no escuro, seja para ir beber água ou ir no banheiro.

Não sabia se era tanto filme de terror que eu alugava das locadoras, na década de 90, ou se realmente eu sentia “algo” que me assustava e não sabia bem o quê.
Esses “bichos” (como a minha filha de 2 anos chama hoje) e fantasmas, nada mais eram do que projeções do meu medo de avançar no desconhecido, literalmente.
Esse medo, em especial, me persegue até hoje. Não o dos “bichos e fantasmas” mas de caminhar sem saber aonde vai dar.
Vem aquela voz baixinha da consciência e diz: “faz isso, vem por aqui”… E eu apenas sigo, com medo, mas mais medo ainda de não seguir e cair no precipício! Como se estivesse dirigindo em um dia nublado com cerração intensa onde eu só consigo enxergar a linha que divide a estrada, com os carros vindo do outro lado e sem acostamento (só quem já viveu essa situação sabe a dimensão disso!)

Pois então, seguir nessa estrada da vida enfrentando o medo do desconhecido é um medo real que afronta muitas pessoas, pelo mundo afora. Alguns dizem não sentir esse medo, porque na verdade nem estão dirigindo e não estão nem aí para a tal voz, é o tipo: “eu acho que estou acordado, mas na verdade ainda estou dormindo”. Isso a gente só se dá conta quando começa a acordar um pouquinho e sai de um estado de arrogância para um pouco mais de humildade.

Na sequência, adotamos o padrão de “meu mestre mandou”. Encontramos um mestre (encarnado ou não) o que é ótimo também, pois como aprendi em um hino devocional do Lúcio Mortmer: “nessa estrada tem passagem dura, tem momentos como noite escura, mas na frente sempre a guiar, tem a luz para quem alcançar”. Então, simbora seguir o mestre, com amor e alegria no coração!

Mas o verdadeiro mestre ensina o discípulo a voar e uma hora ele diz: “voa passarinho, tua hora chegou!” E pode, literalmente, lhe jogar abismo abaixo, para que você passe pela “noite escura da alma” e encontre seu verdadeiro mestre interno, aquela voz adormecida que estava presente lá desde o início da viagem.

Nesse momento, não há como dormir de novo. Embora, a gente tente se fazer de surdo, de sonso, de “sei não, isso não é pra mim… Quem sou eu? Uma reles mortal! Deve ser o ego se fingindo de eu superior, porque eu não sou nada mesmo, que valor eu tenho para algo tão grandioso?” E falamos todo esse discurso com uma falsa humildade, como se quiséssemos fugir da responsabilidade e disciplina inerentes que é aceitar uma missão, muitas vezes programada antes mesmo da sua encarnação! Aff, que responsa!
Parece algo tão gigantesco que o medo assola e lhe faz pequeno. E esse medo, específico, aprendi ser bom, pois nos torna verdadeiramente humildes e prudentes para não cair novamente no abismo da arrogância e voltar à roda de samsara. Ou seja, a evolução é eterna e infinita, não tem começo nem fim.

Porque esse processo acontece em upgrades energéticos e quando você pensa que “chegou” há ainda mais um degrau a ser trilhado. E assim, subindo a “Escada de Jacó” vamos rumando ao nosso ser divino, ao nosso eu-Deus, à comunhão tão prometida em tantos caminhos espirituais.

E agora, como trazer isso tudo para a terra sem se perder? Sem ficar se achando, integrando essa sabedoria em todos os corpos: físico, emocional, mental e espiritual?
Com isso, não digo que cheguei lá (ou aqui), apenas compartilho um vislumbre de quem visitou o Google Maps e olhou a cidade de cima, mas que obviamente não dominou todas as “estradas” da cidade, todos os ensinamentos intrínsecos à vivência terrena.
Viver é um eterno processo de autoconhecimento. Podemos andar como sonâmbulos, semiacordados ou completamente despertos. De que modo você se move em sua vida? Com um olho aberto e outro fechado? Dorme não querendo acordar nunca mais? Ou não dorme com medo de voltar a dormir? Há tantas nuances tênues nesse caminhar! Sutilezas e subjetividades… Não há uma verdade única, graças a Deus!
Há apenas um “caminho reto e estreito” que leva à realização e integração da unidade.
Fora disso, realmente não há salvação, pois na unidade fomos criados, existimos e nos movemos. Só há Um! Despertar para essa essência divina deveria ser o alento da nossa vida, do despertar ao dormir. Cada pessoa ou trabalho que surgisse em nosso caminho, ao longo do dia, poderia ser encarado como um “video-game”, no qual tenho um objetivo a alcançar. Os “chefões” de cada fase são os elementos negativos que tenho que dominar. Eis aí os verdadeiros “fantasmas e bichos”: a inveja, a luxúria, o ódio, o egoísmo, a ganância, o desejo pelo poder e fama, e por aí vai…
Vai, vai… Como um rio, um dia, encontra o mar.
Um dia, vamos também lá chegar (ou aqui!).
Ana